Venezuelana que perdeu gêmeas na porta de multinacional em MT ganhava R$ 1,9 mil e tinha jornada de 8 horas

A venezuelana que perdeu filhas gêmeas após entrar em trabalho de parto no frigorífico que trabalhava, da multinacional BRF, em Lucas do Rio Verde, recebia R$ 1.9 mil e sua jornada se estendia das 3h30 às 13h18, com uma hora de intervalo. As informações constam no processo que tramita no Tribunal Regional do Trabalho, o qual condenou a multinacional por omissão e negligência.

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A sentença da 2ª Vara do Trabalho de Lucas do Rio Verde determinou que a empresa pague R$ 150 mil de indenização pelos danos morais, além das verbas rescisórias, após reconhecer a rescisão indireta do contrato de trabalho.
Segundo os autos do processo, a BRF informou que a venezuelana cumpria carga exata de 8 horas e 48 minutos, com uma hora de almoço e três pausas de 20 minutos. Seu salário era de R$ 1.975,60.
Impedida pelo seu supervisor de sair durante o expediente para realizar o trabalho de parto, ela perdeu as filhas gêmeas que esperava. O caso aconteceu em abril de 2024, quando a trabalhadora, grávida de oito meses, começou a se sentir mal no início da jornada, às 3h40.
Com fortes dores, ânsia, tontura e falta de ar, ela entrou em trabalho de parto e buscou socorro junto à sua líder de setor e ao supervisor. Mesmo tendo insistido, foi impedida de sair do local devido ao funcionamento da linha. Foi quando ela sai por conta própria, sentou no ponto de ônibus na frente da empresa na esperança de ser atendida em algum hospital. Contudo, já em trabalho de parto, sua primeira filha chegou a nascer na porta da multinacional, falecendo logo em seguida. Na sequência, o mesmo aconteceu com a segunda.
O frigorífico alegou que o parto ocorreu fora de suas instalações, em área pública. Também afirmou que a trabalhadora recusou atendimento pelo setor médico da empresa e que não havia registro de gravidez de risco. Sustentou ainda que a negligência foi da própria empregada, com base no argumento de que o trabalho de parto dura entre 8 e 12 horas.
Mas, documentos e depoimentos apresentados ao processo demonstram que a empresa sabia da gravidez da empregada e havia inclusive alterado o setor dela para uma atividade compatível com a condição de gestante.
O enfermeiro responsável pela área médica confirmou que o protocolo de atendimento não foi seguido. No mesmo sentido, depoimento da representante do frigorífico confirmou que nem o líder, nem o supervisor e nem a secretária entraram em contato com o SESMT da empresa, apesar de haver normativa interna para isso em caso de incidentes.
Contrariando a defesa da empresa, a técnica de saúde que atuava no frigorífico no dia do ocorrido afirmou na audiência que “não recebeu nenhuma ligação da portaria para ser informada sobre a situação” e o enfermeiro da empresa relatou que no prontuário da trabalhadora consta o exame admissional e outros resultados de consultas de saúde. Porém, a empresa juntou apenas o exame admissional, alegando que não consta serviço médico, exames ou atendimentos relativos à gestação da funcionária.
As gravações das câmeras internas da empresa, juntadas ao processo pela própria defesa, mostram que o parto ocorreu nas dependências do frigorífico. A representante da empresa confirmou em depoimento que a técnica de enfermagem acompanhou a funcionária na ambulância e que a médica do trabalho foi chamada posteriormente ao hospital para prestar atendimento.
Conforme o juiz, mesmo se considerada a informação trazida pela empresa de que o trabalho de parto teria demorado 3 horas, ainda assim houve tempo suficiente para disponibilizar atendimento médico adequado, o que não ocorreu. O juiz ressaltou que a autora é imigrante, mulher e gestante, reunindo camadas de vulnerabilidade que exigem do empregador maior diligência.
O juiz também reconheceu que a omissão da empresa tornou insustentável a manutenção do vínculo empregatício, caracterizando a rescisão indireta do contrato. Com isso, a trabalhadora terá direito ao pagamento de aviso-prévio, 13º salário, férias, FGTS com multa de 40% e acesso ao seguro-desemprego.
Diante disso, rechaçou a tese da BRF, a qual apontou abandono de emprego da trabalhadora após o período de licença-maternidade. “A grave e injustificável omissão da ré é suficiente para tornar insuportável a manutenção do vínculo, caracterizando a justa causa patronal”, concluiu.

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